Tráfico humano: Bielorrússia atrai migrantes com promessas falsas e usa-os como arma na guerra com a UE, denunciam agências locais

A tensão militar vivida na fronteira entre a Polónia e a Bielorrússia devido ao grande número de migrantes que tentar entrar ilegalmente no bloco comunitário tem feito escalar a tensão e acusações entre os dois países. Do lado bielorrusso estão milhares de pessoas reunidas para tentar entrar no espaço europeu e em outubro último foram registados 11.300 tentativas de entrada ilegal na Polónia via-Bielorrússia.
Uma vez com acesso à Polónia, muitos migrantes seguem para a fronteira com a Alemanha. De acordo com a Polícia Federal alemã, 4.889 migrantes foram registados após a entrada não autorizada via-Bielorrússia e Polónia no último mês, o dobro dos registados em setembro. Foram ainda assinaladas 7.300 entradas não autorizadas na Alemanha vindas da Bielorrússia em 2021.
Alexander Lukashenko, presidente bielorrusso, declarou na última primavera que não iria mais impedir que os migrantes se dirigissem para a União Europeia, em resposta às sanções da UE devido às eleições não reconhecidas de 2020, no qual o líder do antigo país da União Soviética conquistou um sexto mandato presidencial.
No cerne desta batalha, estão os migrantes, talvez os menos responsáveis deste xadrez tático político. A maioria dos quais chega do Iraque mas é possível encontrar cidadãos da Síria, Congo e Camarões entre os milhares que chegam a Minsk, capital da Bielorrússia. Os pontos de partida mais importantes são, atualmente, três cidades na região curda do Iraque: Erbil, Shiladze e Sulaimaniyya.
O trajeto, conforme tem sido relatado por agências de viagens locais, tem sido feito, pela maioria das pessoas, através do Dubai, Turquia, Líbano e Ucrânia para chegar à União Europeia. Um porta-voz do Ministério do Exterior da Alemanha disse, na semana passada, que o número de voos diretos de Beirute, Damasco e de Amã para Minsk também aumentou visivelmente.
As viagens dos migrantes, estima-se, terão um custo entre os 12 e 15 mil euros, o que inclui vistos, voos e serviços de tráfico humano. Uma agência de viagens de Bagdad, no Iraque, confessou à reportagem dos alemães da ‘Deutsche Welle’ que a embaixada bielorrussa na cidade de Erbil “terceirizou pedidos de visto para várias agências de viagens”. A agência em questão revelou que também recebeu pedidos de vistos para a Bielorrússia mas que não estariam a ser processados. “Antes costumava levar entre cinco dias e duas semanas para emitir um visto”, reconheceram.
Além disso, outras fontes confirmaram à ‘DW’ que os pedidos de visto deixaram de ser feitos para a embaixada da Bielorrússia no Iraque, mas para missões diplomáticas de Minsk em outros países, tais como a embaixada do país em Ancara, na Turquia.
A Belsat.eu, uma emissora de televisão independente na Bielorrússia, citou uma notícia do portal online belarusso KYKY.org, segundo a qual 12 agências de viagem locais teriam recebido autorização “secreta” para organizar vistos para estrangeiros.
A viagem, feita por avião, tem feito aumentar a procura. Há empresas registadas na União Europeia que estão atualmente a alugar aviões para a companhia aérea nacional bielorrussa Belavia. Os ministros das Relações Exteriores da UE querem tomar medidas contra esta prática e estão a considerar sanções. O centro de aluguer de aviões na UE é a Irlanda. As empresas irlandesas administram mais da metade dos aviões alugados do mundo.
“Belavia Airlines oferece voos diretos de Minsk para Istambul, Dubai e outros lugares. Portanto, só tem de se dirigir até lá. É um pouco mais caro mas ainda assim viável”, disse à DW o operador turístico baseado em Bagdad.
VIP Grub, um serviço de emissão de passaportes e vistos em Istambul, também alega trazer pessoas para a Europa por “meios convencionais” e faz propaganda aos seus serviços alegando que a Europa precisa de trabalhadores estrangeiros. Nos anúncios da empresa consta: “Somente as companhias aéreas europeias precisam de 1,2 milhões de refugiados. Aproveite a oportunidade. Pague-nos à chegada.”
As empresas argumentam que são obrigadas por contrato a fazer o aluguer e o ministro do Exterior irlandês, Simon Coveney, disse que apoia as sanções mas só se elas forem aplicadas a futuros arrendamentos, não aos atuais. Outras companhias aéreas, como a Qatar Airways e a Turkish Airlines, têm procedimentos de triagem muito mais rigorosos e exigem documentação válida. Entretanto, como a agência de viagens de Bagdad aponta, pode ser difícil determinar a verdadeira natureza da viagem de um passageiro. “Muitos iraquianos viajam diariamente para a Turquia e para Dubai. É impossível distinguir quem quer ir para a Bielorrússia dos que não querem.”